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Como quase toda brasileira, me criei vendo novelas. Ainda mais em cidade pequena, aonde não temos opções de lazer, acabamos sempre na frente das ilusões que a televisão nos proporciona. Não perdia um único capítulo. O último então, víamos as duas vezes! Depois do advento do videocassete, até gravávamos para lembrar depois...
Sempre acompanhando os dramas das mocinhas sonhadoras e sofredoras, que penavam na mão das madrastas, das rivais e até das irmãs. Vítimas de fofocas, acabavam perdendo o homem amado para recuperá-lo quase sempre às vésperas do fim da novela. Os pobres, sempre dignos, felizes, cheios de alegria e vontade de trabalhar, falando um português corretíssimo, bem educados e amorosos com seus pais. Os ricos, quase sempre vilões, tentando acabar com a felicidade do resto do elenco.
Não tiro o mérito de mostrar certas facetas da realidade, mas as novelas também perpetuam rótulos, como o de que ser rico é ter problemas e ser pobre é que é ser feliz. Conheço muita gente que repete esse chavão. As pessoas não raciocinam que o rico pode usar seu dinheiro e seu poder de forma honesta e empreendedora, trazendo inúmeros benefícios à sociedade. E também não pensam que o pobre que fica o dia inteiro ali naquela vendinha cuidando a vida dos outros, pode ser pobre porque não trabalha tanto quanto deveria.
A novela que terminou semana passada, por exemplo, Viver a Vida, de Manoel Carlos, chegou a sujar o chão da minha sala de tanta água com açúcar... Uma paraplégica com toda a infraestrutura para mostrar o "dilema" dos cadeirantes. Médicos que sempre tinham um tempo pra tomar cafezinho e fofocar no restaurante de um hospital onde não se viam pacientes nem sangue. Modelos baixinhas. Uma fotógrafa talentosíssima que só sabia se interessar pela vida dos filhos e atormentá-los.
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Estes, por sua vez, homens já com 20 e tantos anos talvez, bem sucedidos profissionalmente, fazendo parte da "geração canguru", que não sai da casa dos pais por comodismo. O personagem Miguel, então... o cúmulo da perfeição em um homem: bonito, rico, profissão de status, querido, sempre bem-humorado, sempre presente a todas as primeiras seções de hidroginástica, de massoterapia, de etc, etc, etc da amada, sempre levantando o seu astral, sempre carinhoso...
HELLOOOOO!!! Quando é que vão mostrar pessoas reais nas novelas? NÃO EXISTE HOMEM ASSIM! Pode até parecer desencanto ou descrença, mas é a verdade! Até quando vamos criar nossas filhas nessa ilusão? Todas as novelas, na minha opinião, nesse ponto prestam um enorme desserviço à sociedade, reforçando nos coraçõezinhos jovens a ilusão do príncipe encantado, que já começou lá atrás, com a Bela Adormecida e toda a cambada.
O casal Betina e Gustavo, que ficou a novela inteira tentando ser infiel e não conseguiu... na vida real quem duvida de que ambos teriam chegado às vias de fato? A chata da Helena teria fisgado um homem do naipe do Bruno, com todo aquele nhém-nhém-nhém dela? Sabe... gostei do final da Paixão, que mostrou que nem sempre que nos apaixonamos pelo homem-quase-perfeito, dá certo. Gostei também do final da Alice, com um moderno casamento a três (#sonho rsrssr), ventilando a ideia de que novos tipos de relacionamento podem fazer as pessoas felizes, longe do tradicional vestido de noiva e gravidezes inúmeras dos finais de novela.
Novela é entretenimento. Mas já virou instituição. Pense nisso. Todos os dias, no mesmo horário, as mesmas mensagens subliminares. Eu adoro olhar. Mas, graças a Deus e aos livros que me deram para ler desde criança, eu penso no que vejo. E hoje tenho a opção de estar aqui, na internet, questionando. Vou continuar me divertindo principalmente com novelas do tipo Caminho das Índias, bem fora da nossa realidade, e também com essa Passione, que vai começar, pelo número incrivelmente alto de homens lindos no elenco! Mas vou continuar me irritando com certas coisas.
Por último... sempre torci pelas vilãs! O que seria das novelas sem elas? Só para lembrar algumas... Flora (Patrícia Pilar), em A Favorita (2008); Maria de Fátima (Glória Pires), em Vale Tudo (1988); Laura (Cláudia Abreu), em Celebridade (2003); Taís (Alessandra Negrini), em Paraíso Tropical (2007). Beatriz Segal interpretou uma das maiores vilãs da tevê, Odete Roitman, e quem conseguia perder as loucuras de Nazaré Tedesco (Renata Sorrah)?